terça-feira, 15 de maio de 2012

TRINTA E UMA PROPOSIÇÕES SOBRE O REAL

http://mirantepsicanalitico.blogspot.com.br/2012/04/vinte-e-cinco-proposicoes-sobre-o-real.html?spref=fb




Compiladas cronologicamente por JOSÉ MARCUS DE CASTRO MATTOS (**) _

1959

 (...) a estrela-polar das relações do homem com o real
(LACAN, J. "Da lei moral", in: O seminário, livro 07: a ética da psicanálise [1959 - 1960]. Sessão de 23 de Dezembro de 1959. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1988: 95.)


                                1964
 O que é uma práxis? Parece-me duvidoso que este termo possa ser considerado como impróprio no que concerne à Psicanálise. É o termo mais amplo para designar  uma ação realizada pelo homem, qualquer que ela seja, que o põe em condição de tratar o real pelo simbólico. Que nisto ele encontre menos ou mais imaginário, tem aqui valor apenas secundário.
(LACAN, J. "A excomunhão", in: O seminário, livro 11: os quatro conceitos fundamentais da psicanálise [1964]. Sessão de 15 de Janeiro de 1964. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998: 14.)

 Mas o sujeito está aí para ser reencontrado, aí onde estava (eu antecipo) o real. Já justificarei o que disse aqui, mas aqueles que me ouvem há algum tempo sabem que emprego de bom grado a fórmula: – Os Deuses são do campo do real.
(LACAN, J. "Da rede dos significantes", in: O seminário, livro 11: os quatro conceitos fundamentais da psicanálise [1964]. Sessão de 05 de Fevereiro de 1964. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998: 47.)

 real é aqui o retorna sempre ao mesmo lugar _ a esse lugar onde o sujeito, na medida em que ele cogita (onde há res cogitans), não o encontra _.
(LACAN, J. "Da rede dos significantes", in: O seminário, livro 11: os quatro conceitos fundamentais da psicanálise [1964]. Sessão de 05 de Fevereiro de 1964. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998: 52.)

 Esta satisfação [a da pulsão] é paradoxal. Quando olhamos de perto para ela, apercebemo-nos de que entra em jogo algo de novo – a categoria do impossível –. Ela é, no fundamento das concepções freudianas, absolutamente radical. O caminho do sujeito   para pronunciar aqui o termo em relação ao qual só pode situar-se a satisfação [da pulsão] , o caminho do sujeito passa entre duas muralhas do impossível.

Esta função do impossível não deve ser abordada sem prudência, como toda função que se apresenta em forma negativa. Eu quereria simplesmente sugerir-lhes que a melhor maneira de abordar essas noções não é tomá-las pela negação. Este método nos levaria aqui à questão sobre o possível, e oimpossível não é forçosamente o contrário do possível _ ou bem ainda: porque o oposto do possível é seguramente o real, seremos levados a definir o real como o impossível _.

Não vejo aí, quanto a mim, obstáculo, e isto tanto menos quanto, em Freud, é desta forma que aparece o real, a saber, o obstáculo ao Princípio-de-Prazer. O real é o choque, é o fato de que isso não se arranja imediatamente, como quer a mão que se estende para os objetos exteriores. Mas penso que se trata aí de uma concepção inteiramente ilusória e reduzida do pensamento de Freud sobre este ponto. O real se distingue, como eu disse da última vez, por sua separação do campo do Princípio-de-Prazer, por sua dessexualização, pelo fato de que sua economia, em seguida, admite algo de novo, que é justamente o impossível.
(LACAN, J. "Desmontagem da pulsão", in: O seminário, livro 11: os quatro conceitos fundamentais da psicanálise [1964]. Sessão de 06 de Maio de 1964. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998: 158 - 159.)

1970

 Que o pai-morto seja o gozo, isto se apresenta a nós como sinal do próprio impossível. E é nisso mesmo que reencontramos aqui os termos que defini como aqueles que fixam a categoria do real, na medida em que ela se distingue radicalmente, no que articulo, do simbólico e do imaginário – o real é o impossível –. Não na qualidade de simples escolho contra o qual quebramos a cara, mas de escolho lógico daquilo que, do simbólico, se enuncia como impossível. É daí que surge o real.

Aí reconhecemos, com efeito, para além do mito de Édipo, um operador, um operador-estrutural, aquele chamado de pai-real _ com a propriedade, eu diria, de também ser ele, na qualidade de paradigma, a promoção, no coração do sistema freudiano, do que é o pai do [desde o] real, que coloca no centro da enunciação de Freud, um termo do impossível _.
(LACAN, J. "Do mito à estrutura", in: O seminário, livro 17: o avesso da psicanálise [1969 - 1970]. Sessão de 18 de Março de 1970. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1992: 116.)


 pai-real [o pai-impossível] nada mais é que um efeito da Linguagem, e não tem outro real[outro impossível].
(LACAN, J. "Do mito à estrutura", in: O seminário, livro 17: o avesso da psicanálise [1969 - 1970]. Sessão de 18 de Março de 1970. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1992: 120.)


 A castração é a operação real introduzida pela incidência do significante, seja ele qual for, na relação do sexo. É óbvio que ele [o significante] determina o pai como esse real-impossível que dissemos.
(LACAN, J. "Do mito à estrutura", in: O seminário, livro 17: o avesso da psicanálise [1969 - 1970]. Sessão de 18 de Março de 1970. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1992: 121.)


 É no plano do impossível, como sabem, que defino o que é real.
 (LACAN, J. "Os sulcos da aletosfera", in: O seminário, livro 17: o avesso da psicanálise [1969 - 1970]. Sessão de 20 de Maio de 1970. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1992: 154.)


 Não hesito em falar do real, e isto há um bom tempo, já que foi mesmo por aí que dei o primeiro passo deste ensino. Depois, com os anos, eis que surge uma formulazinha – o impossível é o real –. Deus sabe que disso não se faz de golpe um abuso. Depois aconteceu-me expor não sei qual referência à verdade, o que é mais comum. 
 (LACAN, J. "A impotência da verdade", in: O seminário, livro 17: o avesso da psicanálise [1969 - 1970]. Sessão de 10 de Junho de 1970. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1992: 157.)


 Mas desloco-me com o deslocamento do real no simbólico, e me condenso para dar peso a meus símbolos no real, como convém para seguir o Inconsciente em sua pista.
(LACAN, J. "Radiofonia [Junho de 1970]", in: Outros escritos [2001]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003: 418.)

 (...) demonstrar o real como impossível.
(LACAN, J. "Radiofonia [Junho de 1970]", in: Outros escritos [2001]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003: 420.)


 (...) minha fórmula: o impossível é o real.
(LACAN, J. "Radiofonia [Junho de 1970]", in: Outros escritos [2001]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003: 431.)


 É nessa articulação com o real que se encontra a incidência política em que o psicanalista teria lugar, se fosse capaz de fazê-la.
(LACAN, J. "Radiofonia [Junho de 1970]", in: Outros escritos [2001]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003: 443.) 

1972

 A razão está em que aquilo a que concerne o Discurso-Psicanalítico é o sujeito, o qual, como efeito de significação, é resposta do real.
(LACAN, J. "O aturdito [14 de Julho de 1972]", in: Outros escritos [2001]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003: 458.)

 A estrutura é o real que vem à luz na Linguagem. Obviamente, não tem nenhuma relação com a "boa forma".
(LACAN, J. "O aturdito [14 de Julho de 1972]", in: Outros escritos [2001]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003: 477.)

 Já que estou hoje sendo arrastado pelas trilhas do Inconsciente estruturado como uma linguagem, saiba-se disto: – Esta fórmula muda totalmente a função do sujeito como existente. O sujeito não é aquele que pensa.  O sujeito é, propriamente, aquele que engajamos _ não, como dizemos a ele para encantá-lo, a dizer tudo (não se pode dizer tudo), mas a dizer besteiras (isso é tudo) _.

É com essas besteiras que vamos fazer análise, e que entramos no novo sujeito que é o do Inconsciente. É justamente na medida em que ele não quer mesmo mais pensar, o homenzinho, que se saberá talvez um pouco mais dele, que se tirará algumas consequências dos ditos _ ditos de que não podemos nos desdizer (é a regra do jogo) _.

Daí surge um dizer que não chega sempre a poder ex-sistir ao dito. Por causa daquilo que vem ao dito como consequência. Está aí a prova por onde na análise de qualquer um, por mais besta que ele seja, um certo real pode ser atingido.
(LACAN, J. "A Jakobson", in: O seminário, livro 20: mais, ainda [1972 - 1973]. Sessão de 19 de Dezembro de 1972. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985: 33 - 34.)


1973

 O que não cessa de não se escrever é uma categoria modal, a qual não é a que vocês terão esperado para opor ao necessário, que mais teria sido o contingente. Figurem que o necessário é conjugado ao impossível [portanto, ao real– e que esse não cessa de não se escrever é a sua articulação [a articulação lógica do real-impossível–. O que se produz é o gozo que não se deveria. Aí está o correlato de não haver relação sexual, e o que é o substancial da função fálica.
(LACAN, J. "Aristóteles e Freud: a outra satisfação", in: O seminário, livro 20: mais, ainda [1972 - 1973]. Sessão de 13 de Fevereiro de 1973. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985: 81.)

 De outra parte, eu defini a relação sexual como aquilo que não cessa de não se escrever. Aí háimpossibilidade [aí há real]. E também que nada pode dizê-la _ não há, dentro do dizer, existência da relação sexual _.
(LACAN, J. "O rato no labirinto", in: O seminário, livro 20: mais, ainda [1972 - 1973]. Sessão de 26 de Junho de 1973. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985: 198.)


 E o que faz com que a relação sexual não possa se escrever é justamente esse buraco que toda Linguagem enquanto tal tampona: – O acesso do ser falante a algo que se apresenta como, em certo ponto, tocando no real. Nesse ponto, aí se justifica que o real eu o defina como impossível, porque aí justamente ela não chega jamais – essa é a natureza da Linguagem – a escrever a relação sexual.
(LACAN, J. O seminário, livro 21: les non-dupes errent [1973 - 1974]. Sessão de 20 de Novembro de 1973. Inédito.)


 Digo sempre a verdade: não-toda, porque dizê-la toda não se consegue. Dizê-la toda é impossível, materialmente: faltam as palavras. É justamente por esse impossível que a verdade toca no real [la verité touche au réel].
(LACAN, J. Televisão [1973]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1993: 11.)


 (...) ele [o mundo] é apenas a fantasia com a qual um pensamento se sustenta, "realidade" certamente, mas a se entender como esgar do real.
(LACAN, J. Televisão [1973]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1993: 19.)

1974


 real é o que não depende de minha ideia sobre ele.
(LACAN, J. O seminário, livro 21: les non-dupes errent [1973 - 1974]. Sessão de 23 de Abril de 1974. Inédito.)


 Meu real não é ontológico. Absolutamente, não.
(LACAN, J. Entrevista à imprensa italiana [29 de Outubro de 1974]. Inédito.) 

1975


 O número três, há de se demonstrá-lo como o que ele é, se for o real – a saber, o impossível –. Esta é a mais difícil espécie de demonstração: – O que se quer demonstrar, tornando-se dizer, é preciso que seja impossível, condição a se exigir para o real. Ele – o real – ex-siste enquantoimpossível.
 (LACAN, J. O seminário, livro 22: R.S.I [1974 - 1975]. Sessão de 13 de Maio de 1975. Inédito.)

1976


 Inventei o que se escreve como o real.
(LACAN, J. "Do inconsciente ao real", in: O seminário, livro 23: o sinthoma [1975 - 1976]. Sessão de 13 de Abril de 1976. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2007: 125.)


 Falo do real como impossível na medida em que creio justamente que o real – enfim, creio, se esse é meu sintoma, digam-me –, é preciso dizê-lo bem, o real é sem lei. O verdadeiro real implica a ausência de lei. O real não tem ordem. É o que quero dizer, dizendo que a única coisa que chegarei talvez um dia a articular diante de vocês é alguma coisa concernente ao que chamei de um pedaço dereal.
(LACAN, J. "Do inconsciente ao real", in: O seminário, livro 23: o sinthoma [1975 - 1976]. Sessão de 13 de Abril de 1976. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2007: 133.)

1977


 Trabalho no impossível de dizer.
(LACAN, J. O seminário, livro 25: momento-de-concluir [1977 - 1978]. Sessão de 20 de Dezembro de 1977. Inédito.)

1978


 O fim de análise é quando se girou duas vezes em círculo, quer dizer, reencontrando isso do qual se está prisioneiro. (...). Basta que se veja isto do qual se está cativo. E o Inconsciente é isso, a face realdisso no que se está enredado.
(LACAN, J. O seminário, livro 25: momento-de-concluir [1977 - 1978]. Sessão de 10 de Janeiro de 1978. Inédito.)


 Porém, justamente na análise é o equívoco quem domina. Quero dizer que é a partir do momento em que há uma confusão entre esse real que seguramente somos conduzidos a chamar "coisa", há um equívoco entre esse real e a Linguagem, dado que a Linguagem é seguramente imperfeita _ é sem dúvida ali que se demonstra tudo o que é dito de mais seguro: a Linguagem é imperfeita _.
(LACAN, J. O seminário, livro 25: momento-de-concluir [1977 - 1978]. Sessão de 10 de Janeiro de 1978. Inédito.)


 A Linguagem é um mal útil, e é seguramente por isso que não temos nenhuma ideia do real. Sem dúvida, é aí que eu quisera concluir.
(LACAN, J. O seminário, livro 25: momento-de-concluir [1977 - 1978]. Sessão de 10 de Janeiro de 1978. Inédito.)


Notas.
 (*) JACQUES LACAN (1901 - 1981). Psicanalista. Fundador da Escola Freudiana de Paris (EFP: 1964 - 1980). Autor de Escritos (1966). Coordenador de O Seminário (1951 - 1981).

(**) JOSÉ MARCUS DE CASTRO MATTOS (nascido em 1965). Psicanalista. Coordenador dos SPMN (Seminários Psicanalíticos do Mar do Norte. Macaé/Rio das Ostras [RJ]). Coordenador dos SP-NEPAT (Seminários Psicanalíticos do NEPAT). Diretor-Geral do NEPAT (Núcleo de Estudos Práticas em Acompanhamento-Terapêutico). Editor de ALETOSFERA (Agenda Política da Psicanálise-Ambiental [APPA]). Editor de MIRANTE PSICANALÍTICO (Agenda Política da Psicanálise-Lacaniana [APPLa]). Coordenador do SEP-PSI (Serviço Eletrônico de Postagem Psi). Consultório: Largo do Machado, 29 / Sala 702, Centro Comercial Largo do Machado (“Galeria Condor”), Largo do Machado, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP 22210 – 020. Tels. (21) 2265 43 03 / (21) 3816 03 54 / (21) 9771 68 65. 


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