sexta-feira, 28 de setembro de 2012

ARTHUR BISPO DO ROSARIO – BIOGRAFIA CLÍNICA*







Maria Clara Queiroz Corrêa**
Resumo
A autora procura registrar aspectos biográficos que permitam uma aproximação à subjetividade e à rica obra artística brut
de Arthur Bispo do Rosario, paciente psiquiátrico psicótico crô-
nico. Utiliza-se de escuta ou leitura analítica de sua biografia e de
conhecimentos sobre arte e psicose. Indaga se na experiência da
arte ocorreriam mecanismos mentais análogos aos da psicose,
observada a freqüente confluência de ambas. Segue à apresenta-
ção de seu trabalho discussão sobre arte e loucura, com debatedores e platéia.
Palavras-chave: Psicose; Transtorno Mental; Arte;
Arte brut.
– Miniaturas que permitem a minha transformação, isso tudo é
material existente na terra dos homens. Minha missão é essa, conseguir isso que eu tenho, para no dia próximo eu representar a existência da Terra. É o significado da minha vida.1
Introdução
Procurei registrar, como orientação inicial para nosso debate, não exatamente uma cronologia da vida de Arthur Bispo do Rosario, mas alguns aspectos que permitam uma aproximação ao
enigma de sua subjetividade e de sua obra. Amparei-me no admirável trabalho de Luciana Hidalgo, “Arthur Bispo do Rosario – o Senhor do Labirinto”. Recorri, ainda, ao vídeo realizado por
Hugo Denizart, “O Prisioneiro da Passagem”, onde Bispo é
entrevistado. Também a material de divulgação do Museu Arthur
Bispo do Rosario, da Colônia Juliano Moreira, e a catálogos de
exposições da obra de Bispo.
Como escolher o que poderia ser relevante para a nossa tarefa? Fui orientada por dois parâmetros: de um lado, pela escuta analítica – a leitura flutuante permitindo escolher os pontos
nodais do traçado da subjetividade (certamente de modo artifical,
na medida em que o sujeito e seu desejo só se revelam ao analista sob as condições da transferência –
do que Freud nos advertiu, falando dos limites da análise de sonhos fora do setting); de outro
lado, por certos elementos, que vêm se destacando em meu avizinhamento continuado de duas experiências em co-ocorrência – a
arte e a psicose. Pelo primeiro parâmetro, reuni elementos para
uma “biografia clínica” (estranha expressão!); pelo segundo,
recortei alguns traços que ligam Bispo a outros artistas que do
mesmo modo viveram ambas as experiências indicadas.
Quanto a isso, é importante notar que, em suas investigações
sobre Bispo, Luciana Hidalgo teve acesso aos registros da internação de Ernesto Nazareth2
, que se suicida na Colônia aos 70
anos, depois de transferido do asilo da Praia Vermelha; e ainda
encontrou o “Diário do Hospício”, de Lima Barreto,3
em que o escritor nos fala de sua internação também na Praia Vermelha.
Sobre cada uma dessas subjetividades deveríamos de modo idêntico debruçar-nos com cuidado, ao desamparo dos pré-conceitos
ou diagnósticos apressados. Como bem nos adverte Jean
Dubuffet, em inúmeros pontos de seus Cahiers de l’art brut, saber
que o artista esteve internado numa instituição sob o rótulo da
loucura não habilita a compreender como sua obra se ergueu nem
a avaliar a qualidade de seus efeitos sobre os contempladores. De
fato, saber disso produz somente um fascinante campo de investigação.
A co-ocorrência de que falamos é freqüente e levanta questões interessantíssimas, abalando, a nosso ver, tanto o desenho da psicose quanto o desenho do fazer artístico. Quanto a ela, costumo propor uma pergunta crucial e duas outras, decorrentes
da primeira.
Pergunta crucial: Existe obra de arte que não seja neológica,
isto é, que não exceda de modo notável a gramaticalidade com
que procuramos tecer o sentido do nosso dia-a-dia?
Perguntas decorrentes: 1) Há, na experiência radical da arte,
um exercício das gramáticas do inconsciente homólogo ao da
experiência da psicose? 2) Por que estas duas experiências com
tanta freqüência e com tanta felicidade se conectam no tempo,
seja paralelamente, seja em seqüência?
Enfim, questões que tocam a teoria e a prática daqueles que
se deixam atravessar pelas linhas dos dois territórios nomeados.
Mas passo ao que me foi pedido – a tentativa de lastrear este
debate com uma “biografia clínica” de Arthur Bispo do Rosario.

Biografia clínica
I – A vida, o nome, a recorrência da “santíssima trindade”
Arthur Bispo do Rosario nasceu provavelmente a 14 de maio
de 1909, em Japaratuba, pequena cidade a cinqüenta e quatro
quilômetros de Aracaju. Este dado histórico interessa principalmente ao investigador, que daí se arriscará talvez em conclusões impressionistas, já que Bispo se recusava a falar da família, das
raízes, das influências culturais. “Um dia eu simplesmente apareci.”4 O  aparecimento, a  apresentação e o reconhecimento, eis alguns dos significantes, ditos ou escritos por Bispo, que mais
nuclearmente marcam sua subjetividade. Os três têm um lugar
decisivo na organização do delírio e na fabricação dos objetos que
povoam seu campo material.
Aos quinze anos Bispo vai para a Escola de Aprendizes de
Marinheiro, em Aracaju. Na ficha de entrada consta a filiação:
Adriano  Bispo do Rosário e Blandina Francisca de  Jesus.
Notemos os sobrenomes, estreitamente ligados à reconstrução da
biografia: Jesus, Rosário e Bispo.
Na Marinha, Bispo se exercita no pugilismo, prolongadamente e com sucesso. Este talento lhe servirá, inicialmente pelo menos, para garantir uma posição na Colônia, entre o interno e o encarregado, o assim dito faxina ou xerife. Sai da Marinha por motivos de
indisciplina, segundo o artigo 41 do Regulamento Disciplinar para
a Armada. Bispo avalia, entretanto, de outro modo sua exclusão:
“Quando eu era da Marinha, eu era pugilista, levei muita pancada. Hoje eu me sinto. Resolvi cair fora porque os oficiais não gostavam de marinheiro no jornal. Me prendiam quando eu tinha
lutas marcadas com empresário. Aí eu caí fora.”5
Já no Rio, Bispo trabalha na Light entre 1933 e 1937. Devido
a um acidente de trabalho que lhe esmaga parte do pé direito
conhece o Dr. Humberto Leone, seu advogado na causa trabalhista movida contra a empresa. Consegue uma indenização e, mais do que isto, a partir daí, um acolhimento duradouro, carinhoso e respeitoso, partilhado pelas várias pessoas da numerosa família Leone.
II – Os rastros da terra natal aparecendo como saber e fragmento
Missão Japaratuba: eis o nome com que Bispo marca a presença da terra natal num de seus estandartes. Segundo Luciana
Hidalgo, “os signos desse passado trancado a sete chaves não
ficariam fora na reconstrução do novo mundo”. Tendo conhecido a pequena cidade, onde investiga o que Bispo não nos diz, a
sensibilidade de Luciana não deixa de recolher rastros importantes. O que, de Japaratuba, ela pôde encontrar na obra e nos componentes do delírio?
a) O culto, a veneração das gerações mais velhas confundia-se
com o culto religioso: “E a Sexta-Feira da Paixão reservava
um culto de gerações. Toda criança, adolescente ou mesmo
adulto ia de casa em casa, ajoelhava-se diante do pai, mãe, tio,
tia, avô, avó, e pedia uma bênção. Uma via-crucis doméstica,
em reverência à autoridade dos mais velhos. O ponto alto era
a Via Sacra, rito coletivo muito concorrido.”6
b) O jejum (de que Bispo era adepto) era uma prática repetida
anualmente: “A Quaresma impunha uma regra infeliz para um

povo arraigado em raízes folclóricas. Quarenta dias de jejum
de comida, canto, dança e alegria. Uma época em que só os
sinos badalavam para quebrar o silêncio na vila. Um martírio
em nome de Jesus, mas osso duro de roer num povoado que
brilhava pelo reisado, pela taieira e por tantos outros festejos.
Japaratuba era uma usina de tradições e alegorias.”6
c) A roupagem e os bordados (elementos marcantes de sua arte)
constituíam pontos altos dos festejos tradicionais: “As festas
começavam com semanas de antecedência, nos dedos ligeiros
das costureiras que cerziam as roupas dos folguedos. Cada
traje impunha o devido respeito, encerrava tradições africanas, indígenas, nordestinas. Os bordados eram a mais perfeita tradução da cultura de Japaratuba. Agulhas abriam caminho em pontos de cruz e desdendês para compor desenhos e
salpicar brilhos nas fantasias.”7 Na chegança “a herança lusitana exibia a moda marítima. Integrantes vestiam réplicas de
trajes da Marinha e encarnavam almirantes, tenentes, grumetes. Embarcavam na farsa folclórica e abusavam de encena-
ções náuticas. O rei mouro usava manto vermelho cravejado
de bordados, coroa e espada.”7
III – A apresentação e o primeiro reconhecimento
A 22 de dezembro de 1938 inaugura-se para Bispo seu
tempo: sete anjos o “deixam” à meia-noite na casa da Rua São
Clemente 301, residência do advogado Leone, onde morava num
quarto no fundo do quintal. Bispo avisa então a Humberto Leone
que irá se apresentar na Igreja da Candelária. Segue para a Rua 1º
de março e visita uma série de igrejas do centro da cidade.
Durante dois dias se entrega a essa peregrinação, afirmando que
uma cruz luminosa lhe risca as costas. No Mosteiro de São Bento
(que se alterna nos relatos com a igreja da Candelária) anuncia
aos monges que havia vindo para julgar os vivos e os mortos.
Deste acontecimento fica o registro minucioso num estandarte
que Bispo tece, tempos depois.
Os monges chamam a polícia. Bispo é levado para o hospício
da Praia Vermelha. Estamos no dia 24 de dezembro de 1938.
Apresentação e reconhecimento: este tempo traz em ato o que os
significantes fundamentais do sujeito dizem.
É numa trindade que Bispo se posiciona. Na casa do advogado Leone, um triângulo masculino – José Leone no trono de Deus,
Humberto Leone, seu filho, no papel de Jesus Cristo, e Bispo no
de São José. Mais tarde Bispo afirmaria ouvir as vozes de São José,
seu pai, e da Virgem Maria, sua mãe, desde a infância. O lugar de
Jesus era do próprio Bispo. É deste lugar que se vê reconhecido
pelos médicos e pelos pacientes internados nas intituições em que
sucessivamente vive. “Você está falando com ele.”
IV – Bispo, o diagnóstico e a relação com os médicos
A entrada na instituição psiquiátrica não pode apagar a lógica do delírio. Nela Arthur Bispo por vezes se sustenta; em outros
momentos a brutalidade dos fatos causa espanto. “Eu só me admiro aqui. Quando eu vim para cá houve uma junta de Médicos,
quando eu vim do Mosteiro de São Bento, o médico, Dr. Odilon,
e outros psiquiatras, quando perceberam, disseram: ‘O senhor é
Deus!’ E tem na minha ficha como esquizofrênico-paranóide. É

erro! Erro médico porque, pela história do Sagrado Criador,
médico-psiquiatra não existe. Médico, sim, psiquiatra, não. E o
médico-psiquiatra me fazia isso, me dava remédio. O médico,
quando é bom, quando percebe, não dá remédio a mim.”8,9
IV – a) O tratamento psiquiátrico da época
Já havia caído em desuso a terapia do banho de imersão no
gelo, que o filme “Leolo” nos mostra. Devemos lembrar aqui a
impressionante filmografia da experiência da loucura e de sua
terapia: desde os biográficos “Leolo” e “Frances” até os ficcionais
“Um Estranho no Ninho” e “Bicho de Sete Cabeças.”
A Colônia Juliano Moreira, fundada nos anos 20, mantinhase consoante com a psiquiatria mundial. Os tratamentos ministrados eram importados dos centros psiquiátricos europeus. Ugo
Cerletti generalizou o eletrochoque para o tratamento dos loucos.
Verificara os efeitos das crises convulsivas por que passavam os
porcos num matadouro de Roma, antes do abate. Aparelhos para
o eletrochoque em seres humanos foram inventados por ele e por
Lucio Bini. Bispo, assim como Antonin Artaud, foi submetido à
terapia do choque, que se aplicava na Colônia em média três
vezes por semana, em todos os internos, independente de seus
diagnósticos. Luciana Hidalgo nos relata com minúcias as variantes perversas do método.
De Portugal chega a lobotomia, inventada por Egas Moniz,
que recebe em 1949 o prêmio Nobel de Medicina. Em 1952 a
Colônia ganha um centro com o nome Clínica Psicocirúrgica
Egas Moniz. Dela Bispo pôde escapar.
A partir de 1950 os neurolépticos ganham força. Bispo percebeu que as novas drogas minavam sua capacidade de trabalho.
Praticava então a reclusão voluntária, recusando medicamentos e
trabalhando na reconstrução do mundo, exigida pelas vozes. “A
caminho dos 80 anos, constava do prontuário que Arthur Bispo
do Rosário era o paciente mais antigo da Colônia Juliano Moreira.
Teimoso e desconfiado, o senhor de outros tempos recusava a
comida que Maria Iracema e outros internos levavam para ele.
‘Não quero essa comida, está com gosto de farinha braba. Estão
botando remédio na minha comida e estragando a minha vista.”10
Freud só chegaria à Colônia na década de 1980. É a época do
tratamento feito pela estagiária Rosângela Maria Magalhães
Gomy e da experiência do amor – amor de transferência. Toda
uma apresentação poderia ser feita em torno à relação da Virgem
Maria, das misses e de seu amor idealizado pela estagiária de psicologia que dele se ocupa, bem perto do tempo final de sua vida.
IV – b) O cuidado de si
É interessante comparar o cuidado que Bispo minuciosamente se dava aos cuidados oficiais anteriormente descritos.
O corpo, seu uso, seu trato:
– O boxe: “Sempre fui faxina dos fortes, pra dar nos doentes quando estavam agitados, pra entrar nos cubículos... Na Praia
Vermelha, bati muito em paciente, mas nos maus que queriam
quebrar tudo. Era obrigado a chamar o médico para pegar o
doente. Antigamente isso aqui (a Colônia) pagava 15 mil réis de
quatro em quatro meses para os doentes que trabalhavam. Não
era nada.”11
Bispo,  xerife na Colônia, no início dava socos nos

agitados para desacordá-los e misturava remédio na comida dos
que se recusavam a tomá-lo. Eis aqui uma questão importantíssima, revelada também por Dráuzio Varella no “Estação
Carandiru” – o dentro/fora em que alguns se põem face a certos
campos, posição nomeada na Juliano e no Carandiru do mesmo
modo: faxina.
– A frugalidade e o jejum: “Vou secar para virar santo.”12
Com esforço conseguiam que comesse algumas frutas e bebesse
água com açúcar. “Em geral não comia carne, evitava arroz, feijão, macarrão. (...) O cardápio de Bispo era recheado de aipim,
batata-doce, basicamente, sopa de legumes.”13
– A limpeza: “Joel respeitava os estranhos caprichos de
Bispo. Sempre que ia até o comércio de Jacarepaguá, comprava
vidros de óleo que Bispo passava pelo corpo depois do asseio diá-
rio. Apesar de odiar chuveiro e fugir dos rituais coletivos do
núcleo Ulisses Viana, ele era um dos internos mais limpos. Com
uma toalha molhada, esfregava todo o corpo. No final passava
óleo.”14
– O conhecimento de sua vida psíquica: a  transformação
nomeava o tempo em que Bispo precisava ficar trancafiado,
segundo seu próprio pedido. Um retorno ao mesmo tempo temido e produtivo, levando-nos a perguntar: é a inundação de angústia um dos mananciais da experiência de construção material do
objeto, para todo e qualquer artista, passando ele ou não pela
experiência da psicose? O sinal vinha de uma pergunta dirigida
ao outro, em circunstâncias corriqueiras de conversa. – “O
senhor não está vendo nada aqui em cima da minha cabeça?” “De
meses em meses, chegava perto de Altamiro – guarda do núcleo
Ulisses Viana e depois inspetor-chefe da Colônia – e pedia, firme:
– Me prende porque eu estou me transformando.
– Em quê? – perguntava Altamiro.
– Em rei. Me prende que eu vou entrar em guerra.
(...) Nessas horas, ele exigia que fosse trancafiado no quartoforte. Confessava que não conseguia se controlar e temia por perdas e danos, uma vez solta a besta dos delírios. Tirava uma folga
do cotidiano, uma licença no trabalho de xerife do pavilhão e só
saía dali quando lhe acudiam os presságios de uma sanidade
anunciada.”12
Bispo ali permanecia às vezes durante meses. Ele
mesmo fala de um recolhimento que teria durado sete anos.
V – Os espaços de Bispo e sua ocupação
“Bispo hibernava naquele minúsculo quarto-forte de
Jacarepaguá, assombrado por uma obsessão. Era um enviado de
Deus, um cristo, quem sabe, mas antes de tudo um maestro
empenhado em dirigir a reconstrução do mundo. Um universo de
miniaturas, uma espécie de reedição da existência na Terra, conforme seus sentidos. Uma missão. E tudo num espaço onde ele
mal conseguia esticar o corpo emagrecido pela alma inquieta.
Era nessa fase de transformação e isolamento que a arte brotava das mãos endurecidas, talvez pelos excessos nos ringues do
passado ou por uma artrite que evoluiria com o tempo. A arte de
Bispo nascia embutida de sacrifício. Os dedos ligeiramente
emperrados se lançavam numa impressionante técnica inventada
pelo artesão.”15
Bispo circulou por vários lugares: de Botafogo ao Centro, daí
à Colônia Juliano Moreira, de onde retornou quantas vezes quis

a Botafogo e ao Centro. Bispo tinha passe livre na Colônia e nas
casas dos Leone. Em todos os lugares a mesma lógica quanto à
posição do sujeito e à ocupação do lugar: espaços de recolhimento e espaços da confecção dos objetos. Vivências fundamentais,
estreitamente interligadas.
V – a) Pré-espaços da loucura:
A cidade natal e a Marinha e seus navios. É de se notar o delicado trabalho de seleção dos elementos do delírio que Luciana
Hidalgo faz a partir de seus estudos sobre a cidade de Japaratuba.
V – b) Espaços da loucura: o dentro-fora, as entradas e saídas.
Em cada espaço havia um lugar reservado para a reclusão
necessária nas transformações que levavam à produção da obra.
“Bispo era um homem comum aos olhos de Humberto Leone até
o primeiro chamado e a admissão no manicômio. Passado o choque da família ao vê-lo encarcerado, Bispo voltou para o seu
quintal de Botafogo quantas vezes teve vontade. Quando queria,
dava um jeito de driblar a severa burocracia da Colônia Juliano
Moreira e ia parar na Rua São Clemente. Foi então que os Leone
começaram a notar o manto bordado com capricho e usado por
Bispo em dias especiais, diferente da cotidiana camisa de malha
largada por cima da calça preta. O traje simples, diário, não caía
bem na fase sacra. Bispo dizia que precisava de um manto à altura de seu fervor sagrado para assumir o trono de Deus. E foi no
refúgio do pequeno quarto dos fundos de Botafogo que ele come-
çou a tecer este e outros bordados.”16
– O casarão da rua São Clemente e as casas dos Leone: “Nos
anos 50, no meio do vaivém entre Botafogo e a Colônia Juliano
Moreira, ele mantinha vários endereços. Mas todos os caminhos
levavam a um só sobrenome. Os Leone espalhavam-se, cresciam
e se multiplicavam. Bispo pulava de casa em casa. Passava um
tempo com Humberto e Belinha (na Rua Macaúbas e depois na
Gastão Bahiana, em Copacabana), refugiava-se no escritório da
Avenida Rio Branco, visitava dona Auta no casarão da Rua São
Clemente.”17
“Nos vácuos das transformações, entre as décadas
de 40 a 60, Arthur Bispo do Rosario, um dos milhares de esquizofrênicos do hospício de Jacarepaguá, corria para os Leone.
–A Colônia é minha segunda casa – avisava aos patrões.
Quando sentia o prelúdio da sanidade, passados os temporais que o transformavam, Bispo fugia para Botafogo, a primeira
casa. Os Leone o recebiam de coração e olhos abertos. Tinham
em Bispo um empregado fiel e se esforçavam para respeitar a imaginação fértil do rapaz.”18
– O escritório da cidade: pela recusa de uma criança em reconhecer a cruz que trazia nas costas, Bispo diz não mais poder ficar
na casa da Rua São Clemente. Acaba refugiado no escritório de
Humberto na Avenida Rio Branco: “Passou quase um ano numa
sala desativada do escritório de advocacia de Humberto Leone,
alienado e perseguido por fantasmas que não conseguia exorcizar.
Não saía dali para nada, não abria a janela, pouco ouvia, nada
falava. (...) Os meses voavam, e Bispo sequer deixava a luz do sol
entrar na saleta. Durante a semana, o movimento no escritório
chegava aos seus ouvidos, mas sábado e domingo só se ouvia ali
o ruído de seus dedos a serviço do juízo perfeito.

Humberto Leone hospedou Bispo até o limite. Um dia, flagrou-o diante da janela aberta do escritório. Intenção suspeita.
Achou que não seria capaz de segurar as fantasias do empregado
e temeu por sua segurança. Não queria, contudo, voltar a vê-lo
amarrado por enfermeiros e metido numa camisa-de-força. O
patrão embarcou nos desígnios delirantes de Bispo e deu asas à
imaginação. Primeiro Humberto inventou uma história romanceada, sobrecarregada de detalhes mirabolantes e muito suspense, em que Bispo aparecia como personagem de suma importância. Conquistado pelo afago no ego, ele se deixou navegar nas
águas da mais pura ficção e, de bom grado, se convenceu a sair
do escritório, de volta para o manicômio. Humberto contou com
a ajuda de um policial e de alguns amigos médicos e advogados
para enriquecer a encenação e levá-lo para o hospício, com direito a cortejo de carros no caminho.”19
– O hospício da Praia Vermelha, Hospital Nacional
dos Alienados.
– Breves passagens pelo Hospital Pedro II, onde não fica por
não suportar ver os doentes agitados; sua estada é imediatamente
anterior ao convite ao trabalho de expressão pela pintura feito
por Nise da Silveira.
– A Amiu de Botafogo, num segundo intervalo da Colônia:
“Humberto Leone hospedou Bispo no escritório da Avenida Rio
Branco mais uma vez, mas os altos e baixos emocionais eram inevitáveis. Num belo dia de 1962, ele pediu ajuda ao cunhado, o
pediatra Avany Bonfim, casado com sua irmã Valquíria, um dos
proprietários da Clínica Amiu, na Rua Muniz Barreto, em
Botafogo. O médico precisava de um vigia no pronto-socorro
pediátrico e de um braço forte para tocar as obras na clínica.
Humberto explicou o caso, disse que Bispo tinha passagens registradas em hospícios, mas que era um ótimo sujeito. Dr. Bonfim
aceitou o novo funcionário sem esconder um certo receio ao
conhecer, numa manhã, aquele homem com cara enfezada e cabelo assanhado que chegava ali para trabalhar. Bispo encontrava
pouso em novo endereço e só sairia, de volta para a Colônia
Juliano Moreira, anos mais tarde.”20
– As celas do pavilhão 11 do núcleo Ulisses Viana da Colônia
Juliano Moreira. Bispo permanece na Colônia por cinqüenta e
um anos, interrompidos por saídas e permanências fora da instituição. Nestas ocasiões, como já dissemos, encontrava sempre
amparo na família Leone e em alguns de seus amigos: na casa do
patriarca e da matriarca, José e Auta Leone, na rua São Clemente,
no escritório de advocacia da cidade, nas casas dos filhos e filhas
do casal, na clínica médica da Amiu, ainda em Botafogo. Há lacunas de informações quanto à alternância destes tempos.
VI – O auto-exílio serve ao trabalho do objeto
VI – a) Se um delírio orienta a obra e lhe serve de impulso inicial,
o cuidado para sua construção em tudo releva o saber do artista.
– A materialidade é cuidadosamente catalogada no final
da vida.
– Além da escolha cuidadosa da materialidade, nota-se uma
exploração insistente e sutil de sua gramática.
– A obra de Bispo se discute a partir da noção de bricolage,
trabalhada por Lévi Strauss em La pensée sauvage; a lógica do

rizoma de Deleuze e Guattari oferecem também uma excelente
aproximação ao trabalho de Bispo.
– O esforço para a realização é incessante:  Praxis omnia
vincit, inscrição no portão principal da Juliano Moreira. O corpo
se oferece, em esforço admirável, à construção do objeto: desfiava seu uniforme azul da Colônia e aproveitava o fio para tecer e
bordar. Lembramos aqui das descrições sobre um outro esforço,
o de Aleijadinho. Notamos, segundo a lógica do rizoma, que os
dedos servem como máquinas abstratas, desmontando um territó-
rio, extraindo dele a materialidade que permite a nova edificação.
Bispo se mantinha à margem da rotina de Juliano, nos momentos
em que um homem vira massa enfileirada, escapando à hora da
comida e mesmo ao uso dos remédios. Aqui lembramos o trabalho incansável de outros artistas, também em estado de reclusão:
Clement, que esculpe seus lambris sobre a maderia da cela do
hospício; Wölfli e Aloïse. Trabalhos e vidas documentados pela
Collection de l’art brut e expostos em Lausanne, na Suíça.
Vivência radical da konstant Kraft, qualidade diferencial da
energia pulsional, como bem fez notar Freud – força constante,
exigência de trabalho feita à mente pelo corpo. “Bispo sempre se
impunha reclusões forçadas e uma rígida disciplina. Se aquela sua
missão divina um dia ganharia status de arte, comparada à obra
de Marcel Duchamp e outros artistas ilustres, ele ignorava. Bispo
encarava a reconstrução do mundo como um trabalho. Aliava o
dom do artesão ao esforço diário, descansava carregando pedra,
batia ponto na cela transformada em ateliê.”21
VI – b) A vida e espaço de trabalho estão unidos.
A imersão do artista no ateliê é marca de muitos, mesmo entre
os que a cultura reconheceu: lembremos Francis Bacon e seu caos,
Galdi e seu obrador na Sagrada Família, Giacometti envolto no pó
de sua escultura, Brancusi e sua casa-ateliê (hoje reconstituída ao
lado do George Pompidou), Camille Claudel e o apartamento da
Ile Saint-Louis – a obra erguendo-se da acumulação caótica. E
lembremos ainda que o caos não é desordem, mas a rapidez e a
labilidade das formações. É este ritmo das formações que pode
avizinhar a experiência radical da arte e da psicose?
VI – c) O garimpo do resto e do útil ocupa o artista e vários “ajudantes.”
De que modo Bispo conseguia o material para sua obra?
–Desfiava uniforme e bordava sobre os lençóis e cobertores
da Colônia.
– Funcionários e pacientes nem sempre compreendiam as
motivações religiosas e as tendências artísticas de Bispo, mas passaram a levar para ele todo tipo de sucata, em troca de objetos do
escambo local: café e cigarro e até dinheiro vivo. (É interessante
pensar que esta materialidade levada a Bispo motiva os assemblages. Havia algo de planejado e algo de acaso na materialidade que
Bispo converte em suporte significante. Já os bordados podemos
saber que Bispo os quis, dado o insano trabalho de desfiar e
escrever bordando.) “Era mais ou menos assim, de mão em mão,
que chegavam à cela de Bispo algumas das colheres desperdiçadas pelos pacientes ou os tênis do tipo Conga, parte do figurino
da Colônia. Qualquer elemento daquele reino de fantasia ganhava um sentido sob a lógica de Bispo. Muita coisa ele mesmo
garimpava...”21
Muito material era comprado pelos funcionários no comércio de Jacarepaguá e de Madureira. L. Hidalgo compara Bispo
aos artistas do Pedro II, sob a direção de trabalho de Nise da
Silveira: “Do outro lado da cidade, em Jacarepaguá, Arthur Bispo
do Rosario seguia o seu rumo, alheio à arte dos colegas de delí-
rios. Comporia a obra sozinho, remando contra a maré de incongruências da Colônia e sem ninguém para lhe puxar as imagens
do inconsciente. Não receberia o papel, a tinta e o carvão, mas
desfiaria o próprio uniforme para conseguir a matéria bruta de
sua arte. Não obteria o estímulo de monitores e terapeutas, mas
obedeceria a ordens do além para construir o mundo em miniaturas.”22
Importante aspecto: a arte de muitos se faz forçosamente fora de qualquer projeto terapêutico, seja de que natureza for.
Muitos deliberadamente se recusam às oficinas e produzem em
horários e locais à sua escolha e não segundo as escolhas e os estí-
mulos institucionais.
VI – d) A história da construção de algumas obras é conhecida.
– Os mantos foram confeccionados no sótão da Amiu de
Botafogo: “Parou diante de alguns pedaços de tecido com belíssimos bordados seus. Não tinha reparado neles antes. Eram dois
mantos confeccionados com igual zelo e diferentes estilos. Um
reunia motivos religiosos: rosários, cruzes, velas e crucifixos bordados. (...) – Este é para eu usar quando me apresentar à Nossa
Senhora, para quando chegar ao Reino dos Céus. O médico ouviu
com interesse e perguntou pelo outro manto, uma aglomeração
de nomes inscritos num pedaço de pano, inclusive o seu. – Este é
para quando eu me transformar, e traz os nomes das pessoas que
eu vou proteger na outra vida.”23
– “Bispo havia iniciado a série em madeira na casa e no escritório de Humberto Leone, e os aperfeiçoava na clínica de
Botafogo. Ele garimpava cabos de vassoura, ripas de madeira e
badulaques para construir carrinhos, objetos diversos, variações
sobre um tema: Marinha. Era o início de um seriado marítimo
que o inspiraria dentro e fora da Colônia Juliano Moreira ao
longo das décadas.
Memórias de um ex-marinheiro. Ele construiu uma seqüência de embarcações de madeira nos moldes do veleiro que fizera
para enfeitar o bolo do sogro de Zezé Leone. Rebobinava o cérebro e não abria mão dos detalhes. Mastros, escadas, arrastões,
bóias, botes salva-vidas, bandeiras.”24
VI – e) A obra tem entre seus efeitos promover o cuidado dos
amigos.
“Dr. Amin o chamou para voltar ao hospício de Jacarepaguá
e Bispo, que respeitava muito o médico, foi no mesmo dia. Não
sem antes derramar lágrimas ao despedir-se de Avany Bonfim.
Dias depois, dois caminhões pararam na porta da clínica e saíram
sobrecarregados. Era a mudança de Arthur Bispo do Rosario, que
voltava à Colônia em meados dos anos 60 para reinar soberano no
valioso feudo do núcleo Ulisses Viana.”25

VI – f) Bispo coloca em questão o útil e sua transformação, num
território de penúria.
“Naquele deserto de produtos, muitos pacientes ficavam de
olho na opulência de Seu Bispo. Ele arrumava dezenas de tênis,
colheres, canecas, galochas e tantos outros objetos, enquanto os
vizinhos brigavam para conservar uma única peça longe das
fogueiras de pertences ateadas pelos guardas.”26
“Longe da
fogueira das vaidades e experimentações plásticas mundo afora,
Bispo levava a vida como entendia. Alguns funcionários achavam
aqueles trabalhos muito estranhos. Internos esperavam pelo menor
descuido do dono da obra para mostrar que era um desperdício de
objetos úteis. A supremacia de Arthur Bispo do Rosario no feudo,
contudo, crescia a cada ano. Em geral, o povo o respeitava.”27
VI – g) O trato com o dinheiro escapa à lógica do mercado
do trabalho.
Na mansão dos Leone tinha um quarto só para ele no quintal
da casa, com direito a banheiro. “Ele ficava ali [no quintal] horas a
fio, sem que alguém se aventurasse a descobrir o segredo da alcova.
Pelos trabalhos domésticos não aceitava um tostão. Casa, comida e
roupa lavada era o bastante.”28
Na Amiu: “Ao tratar o emprego com o patrão, Bispo foi direto: não era homem de aceitar salário. Trabalharia de sol a sol, se
necessário, em troca de comida e moradia. Nada mais. Assim se
esmerou, durante anos, nas funções de pedreiro, marceneiro e vigia
da clínica. Abusava da força bruta nos serviços gerais, comia pouco
e recusava remuneração pelo esforço. Dinheiro era fonte de perdi-
ção humana, conforme sua tábua sagrada. (...) Em pouco tempo ele
convenceu o patrão a ocupar um sótão desativado, em busca de
silêncio e retidão. Improvisou uma escada para levá-lo ao novo
quarto, de difícil acesso, e fez daquela área de cento e cinqüenta
metros quadrados o seu território minado.”29
E sob nenhuma circunstância a obra é posta à venda. Traço que
Bispo partilha com inúmeros artistas cujas vidas e obras se contam
nos já indicados Cahiers de l’art brut.
VII – Último tempo na Colônia Juliano Moreira
A 25 de março de 1964, Bispo voltou para suas celas da
Colônia, para aí ficar até o momento de sua morte, às dezenove
horas do dia 5 de julho de 1989. “A reconstrução do mundo em
miniaturas, o registro da existência na Terra.(...) Arthur Bispo do
Rosario passou os anos 60 e 70 em ação. Só em 80 seria apresentado ao mundo.”30,31
Debate
José Eduardo Moreira Amorim*
Passo a palavra a nossos debatedores, Prof. Maurício Viotti
Daker e Prof. José Raimundo Lippi.




Maurício Viotti Daker**
Inicialmente, gostaria de referir-me a uma pesquisa muito
interessante realizada na década de 60. Houve naquela época
uma indagação a respeito de uma possível vantagem genética da
esquizofrenia, afinal sintomas esquizofrênicos são encontrados
em todas as épocas, desde as tábuas cuneiformes, e em todos os
lugares. Se a doença é tão desvantajosa, por que não se extinguiu?
Foi realizada uma pesquisa (Heston, Br J Psychiatry 1966) em
que se compararam filhos de mães esquizofrênicas adotados com
filhos de pessoas normais também adotados. Como se esperava,
os filhos de mães esquizofrênicas tiveram mais esquizofrenia e
uma série de outros transtornos mentais e de personalidade.
Normalmente, os estudos se detêm aí. No entanto, procurou-se
averiguar se haveria alguma diferença entre os grupos no sentido
positivo. E havia, em certos aspectos, a favor dos filhos de mães
esquizofrênicas! Entre as pessoas normais do grupo de filhos de
mães esquizofrênicas se encontravam pessoas que se destacavam
mais na sociedade, como artistas e filósofos, observando-se maior
imaginação e criatividade adaptativas. A pesquisa indicava a possibilidade de que um grupo era mais estável, sem muita variação
para menos ou para mais, enquanto no outro a variação era grande, tanto para menos quanto para mais. Embora investigações
como esta tenham sido esquecidas e não replicadas ou confirmadas, mesmo porque é muito difícil confirmar tais questões objetivamente, acredito que seus resultados possam espelhar a realidade.
Quanto a essa questão da arte e da loucura propriamente,
resta-me (resta-nos), portanto, especular. Apresentarei uma concepção que resulta de minha visão da psiquiatria e das doenças
mentais. Sigo aqueles autores que possuem uma orientação antropológica, como Kretschmer e muitos outros, ou seja, que consideram de alguma forma as doenças mentais como algo inerente
ao ser humano, mesmo quanto a aspectos normais.
Penso que nos seres vivos mais primitivos correspondia a
todo estímulo uma resposta ou ação imediata. Com o tempo, foi
surgindo o que podemos chamar de mediato, um aparelho mental que se interpõe entre o estímulo e a ação. É o que ocorre,
como sabem, na formação do ego, esse órgão mental integrador e
mediador de instintos e estímulos externos. Aí se insere nosso
poder de pensamento ou reflexão, de abstração e simbolismo.
Numa concepção antropológica, como dito, creio que a loucura
faz parte disso. Teríamos, por assim dizer, nossos núcleos paranóide, depressivo, obsessivo, maníaco, histérico e talvez outros.
Estes se encontrariam mais harmoniosos ou em equilíbrio nas
pessoas normais, sem maiores tensões e exacerbações. No doente
mental, no entanto, em grande desequilíbrio. Ora, só há criatividade na diversidade. Isso explicaria essa relação que intuitivamente fazemos da loucura e da arte. Houve uma época em que os
franceses distinguiam duas classes de degenerados, os inferiores e
os superiores, aqueles os doentes mentais, estes os gênios! Ou
seja, o desequilíbrio psíquico vivenciado pelo transtornado mental, assim como as situações dele advindas, podem incitá-lo, caso possua recursos para tanto, à criatividade. Isso explicaria os resultados daquela pesquisa. Já os normais me fazem lembrar o que
Luiz Barros, um portador de doença mental, em contra-ataque
arrebata: “normalpata”. Normalpata é aquele ser mediano, bem
adaptado e desinteressante.
O núcleo psicótico, por exemplo, desvirtuaria tudo para um
novo surgir criativo. A depressão, como se tem propagado, seria
um momento de reflexão, de “pé no chão”, que na mania se levaria à execução. À obsessividade corresponderia a ordem, à
histeria a vontade de mostrar-se, à paranóia talvez a fé, entre
outras possibilidades.
Como disse a Maria Clara, a arte de Bispo não resultou de
uma praxisterapia, mas veio nele e por ele mesmo, uma necessidade própria. E os trabalhos da praxisterapia nem sempre, ou geralmente, não são arte. Por que alguns teriam essa capacidade,
esse recurso de se expressarem em arte? De alguma forma, algumas pessoas têm essa capacidade de nos transmitir uma harmonia e criatividade naturais, certamente existentes na natureza e em
nossas mentes. Claro que, como no caso do Bispo, influenciados
por suas biografias, também pela cultura. Essa influência pode,
ainda, ser expressada como numa espécie de contra-cultura,
como uma ruptura em certos aspectos com algo estabelecido,
como o impressionismo diante do academicismo. Aquela harmonia e criatividade naturais se submetem, portanto, a uma infinidade de influências e se enriquecem com elas, sendo captadas ou
sintonizadas por muitos. Nem sempre sintonizadas na mesma
época, como dado a ocorrer com muitos dos grandes artistas,
gênios ou “loucos”.
Enfim, essa é uma tentativa de concatenar os fatos, com base
especialmente em meus conhecimentos psiquiátricos.
José Raimundo da Silva Lippi*
Agradeço pela oportunidade de participar de evento tão interessante. Ainda ontem à noite tivemos a oportunidade, o Viotti, o Sebastião Vidigal e eu de visitarmos com exclusividade a exposi-
ção do Bispo, pois abriram-na para nós antes da reunião da diretoria da Associação Acadêmica Psiquiátrica. Suas obras são, de fato, inspiradoras para nossa questão sobre arte e loucura.
Como psiquiatra da infância, gostaria de ressaltar essa capacidade que a criança possui de assimilar sua cultura, seus costumes. Todas essas informações, tanto afetivas quanto cognitivas,
farão parte da formação de sua personalidade e permanecerão
como que impregnadas nela. Isso ficou claro na história do Bispo,
quando a Maria Clara falou dos rastros de sua terra natal: a religiosidade, os bordados, os jejuns, os temas da marinha da cultura portuguesa, sem falar que depois ele viria a atuar, de fato, na
marinha. Enfim, até o manto das festas religiosas parece tê-lo
impressionado de modo a ser revivenciado em sua obra. Ele teve,
portanto, um desenvolvimento psíquico especial, rico em folclore e cultura. Além disso, existe ainda aquela questão dos arquétipos junguianos, que não sabemos até que ponto existem e se
poderiam ter influído em sua obra. Digna de nota foi a sorte que ele teve de encontrar amparo humano na família Leone. Teve alguém, ou uma família inteira que respondia por ele e que, acredito, tenham sido fundamentais para que não caísse no anonimato manicomial, ou seja, numa anulação de sua identidade. Sempre teve para onde ir, teve referências seguras extramuros, pessoas
que o conheciam e compreendiam.
Mas, e o ato criativo? Há quem apenas repete o que já foi feito e os que criam algo novo. Alguns são realistas, baseiam-se apenas no concreto e já existente, outros são mais idealistas, possuem imaginação para criar algo novo. Einstein, por exemplo, era idealista, porque criou uma teoria sem comprovação anterior.
Bispo, sem dúvida, foi criativo. Na verdade, foi realista e idealista, pois a partir de fatos reais de sua existência criou um mundo diferente transformado em arte, em estilo original inovador.
Curioso é que criava até mesmo em local que não se quer ver,
oculto pela sociedade, uma cela de manicômio. Apesar disso não
se isolou, não se matou, pois continuou criando. E às vezes até
pedia para ser contido ali! Para se proteger ante delírios persecutórios? Crítica própria ante seu estado potencialmente desestruturante ou agressivo? E não havia recursos medicamentosos
àquela época. Seja como for, os manicômios daqueles tempos costumavam oferecer condições muito precárias. Lembro-me, por exemplo, de ver urubus pousados nos panelões, alimentando-se
da comida a ser servida aos loucos no manicômio de Barbacena.
E não havia alguém com a sensibilidade de uma Nise da Silveira.
Veio-me a indagação: por que sou psiquiatra? Confesso que
tem a ver também com minha existência. O Bispo se recolheu em
suas fantasias, eu me defini pela psiquiatria. Achei que resolveria
todos meus conflitos e dificuldades, que assim poderia ser útil
para resolver os conflitos dos outros e ter meu lugar na sociedade. Depois achei que a análise era o caminho. Vieram os novos medicamentos. Mais recentemente cheguei à conclusão de que
ser apenas psiquiatra não bastava, donde me envolvi com os direitos da criança e do adolescente. Portanto, acredito que fiz o que pude e que tenho uma razão de ser. O Bispo também.
José Eduardo Moreira Amorim
Nossa querida Maria Clara nos brinda com um texto encantador sobre Bispo, tecido de maneira tal que sua fala, como as linhas de Bispo, bordava nossos pensamentos. Os amigos chegados da
capital mineira, Maurício Viotti e José Raimundo Lippi, incitamnos com pensamentos assim bordados à reflexão sobre a questão que se encontra no vértice deste encontro, a arte e a loucura.
Eu falava à Maria Clara sobre projetos da Associação
CasaViva, sobre um dos projetos que envolve pessoas com transtornos mentais considerados graves, como as com diagnóstico de
psicose. Desse projeto resultou pela 1ª vez em Juiz de Fora uma
exposição com obras de Bispo do Rosario e, pela 1ª vez em
Minas, uma mostra integrando obras do Bispo e de “artistas”
oriundos de serviços de saúde mental, artistas do Rio de Janeiro
e desta cidade. Desejamos que esse projeto dê mais passos e quem
sabe, já adianto isso a nossos debatedores da capital, poderemos fazer uma mostra envolvendo o que hoje aqui debatemos em Belo Horizonte? "Das Minas ao Mar"?
Por que isso? Por que esse empenho da Associação CasaViva
e de tantos parceiros? Há muitos anos Freud nos dizia que “o
artista e o louco estariam um passo à frente da humanidade”.
Trabalhei 8 anos com pacientes psicóticos em instituição aberta,
nada de internações. Destaco aqui este instrumento terapêutico
que nesses anos sempre me inquietou e que levei para minha tese
de mestrado: as conhecidas oficinas terapêuticas. Aqui ao lado da
obra de Bispo devemos repensar, quanto a essas oficinas, a questão: tudo aquilo é arte? Refaço a interrogação, tudo o que se produz nessas oficinas pode ser considerado como arte? Penso que
não. O impacto que nos provoca a obra do Bispo nos auxilia
nessa questão, para mim não tão simples e, muito menos, redutí-
vel a qualquer objetividade.
O que é a arte? O que é o ato criativo? Poderíamos recorrer
a alguns autores que debruçaram sobre tais questões. Questões
chaves para uma pesquisa sobre, por exemplo, o papel da arte na
direção de tratamento da psicose. Ocorre-me no momento David
Hume, o que incita a refletir, dentre outros aspectos sobre o que
chamamos de uma “ordem do natural” e o que chamamos de
uma “ordem cultural.” Gosto de pensar que há um rompimento
do humano dentro daquilo que é “natural” e desse rompimento
uma queda: o homem ”cultural”. A “natureza”, ou melhor, de
nossa “natureza” algo ficou perdido, fruto da queda, e perdido
para sempre (para usar um termo bem freudiano). Agrada-me
muito poder pensar que a arte pode ser uma “linguagem”, muito
própria e especial, capaz, talvez a única a permitir-nos, homens da
cultura, recolher fragmentos do que um dia fomos, digamos, “naturalmente.” É bem verdade que isso ressoa "mítico", contudo considero lícito o propósito. Não me estenderei mais, pois acredito que a platéia também deseja participar do debate.
Finalizo “descompletando” meu pensamento, que isso que chamei “recolher fragmentos” é um artifício (este significante é propositado) de construção de uma “ponte” entre o que é “cultura”
e o que foi “natura.” Se realmente, e particularmente penso
assim, o louco e o artista estão um passo à frente da humanidade, isso
nos permite compreender por que a relação arte e loucura é uma rela-
ção estreita e por que a arte é tão importante, sobretudo nas institui-
ções clínicas, na direção de tratamento das psicoses. A arte encanta,
inquieta, acalanta e espanta... a arte desnuda a humanidade, aponta-lhe direção e sentido, cabendo a nós a interpretação quando possível. Passo a palavra à platéia.
Décio Lopes (Jornalista)
Nise da Silveira chegou a trabalhar com Bispo? Maria Clara Queiroz Corrêa
Os dois não chegaram a se conhecer. Bispo passou um pouco
antes da Dra. Nise pelo Pedro II. O sofrimento do lugar, a agita-
ção dos pacientes fizeram com que Bispo desejasse sair de lá.
Décio Lopes
O Museu do Inconsciente guarda e possui as obras dos
pacientes. Elas não deveriam ser dos pacientes?
Maria Clara Queiroz Corrêa
Quem produz é criador e dono. Embora admire o trabalho
corajoso da Dra. Nise, discordo de como são concebidas as obras,
a produção dos sujeitos, segundo sua perspectiva. Qualificado de
“louco”, o artista não pode ser destituído da autoria e do usufruto de sua obra. Cabe a ele e somente a ele destiná-la, guardá-la, enfim, encaminhá-la como quiser. Como qualquer um de nós,
aliás, quanto a nossas produções. Penso que isto é trabalho de
subjetivação, é tratamento.
a
Aderval Waltemberg Silva (Psicanalista)
Acho que não se está contestando a Nise. A arte faz parte do
processo terapêutico, portanto não pertenceria ao paciente. Mas
a arte como tal, de fato, pertenceria.
Décio Lopes
Acredito que arte é uma coisa, loucura é outra. O que importa é a recuperação do indivíduo. Todo esforço é para a recupera-
ção do doente mental. Se resultou em arte, melhor ainda!
Helenir Maria de Oliveira Pestana (Médica de Família)
Pergunto ao Prof. Lippi sobre o ato criativo. De onde vem?
Do idealismo, da vida?
José Raimundo da Silva Lippi
Esta é minha grande pergunta. Tenho a felicidade de conviver com artistas (minha esposa, por exemplo). Vejo quanto é sofrido. Requer muita dedicação e aprendizado para se atingir o
que seria a maturidade artística. Pensem no treinamento de uma
bailarina, por exemplo. Somos artistas também em nossa atividade na saúde mental. A própria medicina é uma arte, não é? Por que a obra artística se apresenta de determinada maneira? Em
cena o materialismo, o idealismo, também o genético e o que mais
estiver envolvido na vida da pessoa, que com isso se expressa.

Mas o ato criador é um ato muito avançado, é um “novo” que
nem sempre é decodificado de imediato, o que muitas vezes traz
tantas decepções ao artista, apesar de todo seu esforço. Muitos
são reconhecidos apenas após a morte.
O estímulo criador pode ficar contido no mediato, de que o
Maurício falou. Às vezes somos muito perfeccionistas e não liberamos ou expomos a obra, seja artística ou mesmo um trabalho científico, como vejo que ocorreu algumas vezes comigo. Mas,
por outro lado, se somos livres demais, corremos o risco de sermos chamados de loucos!
Cláudia Mara O. Richa (Psicanalista)
Indago sobre a proximidade da loucura e da arte e a respeito do ato criativo. Se a possibilidade desse defrontar com o real, devido à precariedade simbólica e à carência do véu imaginário,
característica da psicose, viabilizaria esta expressão mais livre de
amarras. Aqueles que podem se atrever diante da angústia nesse
mundo psicótico (estrutural) estão mais próximos da arte? E se
no neurótico estamos mais acanhados.
Maria Clara Queiroz Corrêa
Qual é nosso fundo? Uma estabilidade ou uma abertura rizomática? Eis um grande debate, entre as teorias da psicanálise e as
concepções de Deleuze e Guattari. Parece-me que, na neurose, o
sujeito acredita que a estabilidade de um território encontrado é
para sempre. É pouca a intensidade das forças de desterritorialização na neurose.
Maurício Viotti Daker
Vale lembrar que essa dicotomia estrita entre o que é neuró-
tico e o que é psicótico, bem como o que é psicose esquizofrênica e o que é psicose maníaco-depressiva não está definida ao certo. As coisas parecem ser mais fluidas na natureza do que queremos ver e acho que há algo de psicótico no normal, assim como de neurótico ou normal no psicótico, de modo que necessitaríamos, possivelmente, de um modelo classificatório menos rígido
para compreender melhor as relações entre arte e loucura.
Douglas Abreu (Psicólogo)
Até que ponto a neuroleptização pode tolher a produtividade?
Maria Clara Queiroz Correa
Como as pessoas sabem de si! Freud chega a indicar uma
percepção endo-psíquica, pela qual nos avizinhamos, durante o
sonho, a estados que a vida de vigília é incapaz de perceber. Isso
é luminoso e, ao mesmo tempo, profundamente angustiante.
Com quanto posso arcar, valendo-me de meus próprios recursos
psíquicos e corporais? Quando é que preciso pedir o medicamento? Quem é que toma esta decisão do remédio? É a grande questão. Quem é que pede e quem é que escuta esse pedido? Não
tenho nada contra o remédio em si. Só desejo sublinhar a subjetivação que seu uso implica.
José Raimundo da Silva Lippi
Como psiquiatra, inclusive diretor de dois hospitais psiquiá-
tricos públicos, lembro que Freud escreveu que o futuro da psicanálise estaria na bioquímica. Quando falou que a psicanálise lida com a neurose e não com a psicose, o que fez foi manter distância da psicose. Mas a psicanálise predominou na psiquiatria,
era o caminho que existia. Salvo a eletroconvulsoterapia (a partir
da década de 30), que foi usada até de forma abusiva, não havia
tratamentos eficazes. Melanie Klein, Frieda Fromm-Reichmann,
Winnicott, Bion, Lacan e outros vieram sim a se dedicar à psicose. Mas com o advento da farmacoterapia os hospitais começaram
a se esvaziar: eis um dos maiores avanços da psiquiatria moderna,
da medicina. Quando a psicanálise predominava, os hospitais se
enchiam. Agora se esvaziam. Existe a bioquímica. Sua pergunta é
muito profunda: temos o direito de tirar o paciente de seu “natural”? É muito delicado. Mas há consensos, por exemplo em casos
de tentativa de suicídio e noutras circunstâncias críticas. É
mesmo nosso direito impedir que a pessoa morra? Quantas me
falaram: eu quero morrer! Ou teriam o direito de pensar que são
reis ou profetas? Quem está certo, quem está errado? A sociedade nos dá referências para tratar, e geralmente os pacientes e
familiares nos agradecem por isso.
Maurício Viotti Daker
Lembro-me de palestra recente muito interessante do Prof.Valentim Gentil na UFMG, sobre a arte e a criatividade no tratamento do transtorno bipolar maníaco-depressivo. Há necessidade de arte e criatividade no tratamento por parte do psiquiatra, a
fim de propiciar ao paciente os melhores benefícios, entre eles
manter sua produtividade e criatividade. Às vezes uma dose
excessiva da medicação tolhe desnecessariamente a liberdade de
ação do paciente, o mesmo podendo ocorrer com uma dose baixa
demais. A melhor resolutividade no tratamento é possível através
de boa empatia com o paciente, de vivência clínica e de conhecimento científico.
José Raimundo da Silva Lippi
Confesso que detesto medicamentos, mas faço uso de antihipertensivo. Por que não tomaria algum para depressão ou para
outros transtornos mentais?
Erasto Ferreira Gomes (Psiquiatra)
O medicamento mais usado e que causa prejuízo na psicomotricidade é o haloperidol. Há prejuízo na leveza dos movimentos, embora haja melhora da compreensão. As manifestações
artísticas podem ser prejudicadas.
Maria Clara Queiroz Corrêa
Quando falamos em loucura, falamos naquilo que uma
comunidade pensa que é a loucura. Isto é o que eu chamo de a
trágica sorte do nascimento. Sugiro quanto à questão uma obra
muito tocante: “A Louca e o Santo”, de Catherine Clément e
Sudhir Kakar. Nesta obra a psicanalista francesa e o psicanalista
indiano comparam dois “casos clínicos”: o de Madeleine e o de
Ramakrishna. Estas duas pessoas viveram na mesma época, mas
passaram por experiências inteiramente diversas, justamente pela
sorte do nascimento, aqui sobredeterminado pelo espaço geográ-
fico. A comparação sistemática da “sintomatologia” dessas duas
pessoas mostra convergências impressionantes. E o que mais nos
toca é o diferente destino que acarretam: enquanto Ramakrishna
é tratado como um homem santo, na Índia, Madeleine suporta,
na França, as agruras de uma internação de décadas na
Salpetrière, sob os cuidados de Pierre Janet. Leiam o livro, dá o
que pensar. Ajuda a praticar a relatividade.

Aderval Waltemberg Silva
É ótimo que não se respondeu de onde vem o ato criativo.
Quando se têm respostas sensatas, o assunto morre por aí.
José Raimundo da Silva Lippi
Repito Hipócrates:
A vida é breve
A arte é longa
A oportunidade fugidia
A experiência incerta
O julgamento difícil.
José Eduardo Moreira Amorim
É comum encontrarmos alguns historiadores da filosofia que
“atestam” que depois de Descartes todos os pensadores foram (de algum modo) cartesianos. Nós só poderíamos pensar o já pensado. Heidegger concorda: mas somente pensando o já pensado nós criamos. Recordar, repetir, elaborar... Agradecimentos aos participantes, ao fundo a obra inspiradora de Arthur Bispo do Rosario.
notas -

* Palestra no encontro “Bispo do Rosario – Vida e Obra: A Arte e a
Loucura em Debate”, 20 de outubro de 2001, Centro Cultural Bernardo
Mascarenhas, Juiz de Fora, MG. Coordenação: José Eduardo Moreira
Amorim, Associação CasaViva de Juiz de Fora, com participação da
Associação Acadêmica Psiquiátrica de Minas Gerais.
** Psicanalista. Doutora em Teoria Psicanalítica pela Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Tese defendida sobre a questão da co-ocorrência psicose-obra de arte: A experiência do excesso – Por uma revisão
da loucura dos artistas. Professora do Mestrado em Psicologia do
Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora.
Endereço para correspondência:
Rua D. Mariana, 182/ bl. 2/ 502
22280-020 Rio de Janeiro – RJ
E-mail: mc.correa@uol.com.br
E-mail: jeduardoamorim@zaz.com.br

*Psicanalista, Coordenador Regional de Saúde Mental de Juiz de Fora e Diretor-Presidente da Associação CasaViva.
**Professor Adjunto do Departamento de Psiquiatria e Neurologia da Faculdade de Medicina da UFMG, Presidente da Associação Acadêmica Psiquiátrica de Minas
Gerais.

*Professor Sênior do Departamento de Psiquiatria e Neurologia da Faculdade de Medicina da UFMG, Secretário da Associação Acadêmica Psiquiátrica de Minas
Gerais. Membro efetivo do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente.

a) Vale resgatar, a este respeito, trechos de Nise da Silveira em entrevista ao Jornal do Brasil (4 de maio de 1997, entrevistadoras Regina Zappa e Nani Rubin): “Não
diga arte. Eu não tenho nenhuma intenção artística. Temos a intenção de pesquisa. As imagens falam uma linguagem própria. Uma linguagem  principalmente mítica, porque vem das profundezas da psique.” “Essa história de vender os quadros, no sentido geral, é o mesmo que ter uma série de imagens e tirar uma. Aí não se
entende mais nada.” “Imagino que Champollion se suicidaria, se, tentando decifrar a linguagem egípcia, lhe tirassem um hieróglifo.” Sobre a possibilidade de preservar a imagem das obras em computador: “Primeiro de tudo, não conheço esses objetos, não conheço nem mesmo esse bichinho que vocês têm aí parecido com uma
barata” (aponta para o gravador). (Nota do editor)


Referências Bibliográficas
1. Hidalgo L. Arthur Bispo do Rosario – o senhor do labirinto.
Rio de Janeiro: Rocco, 1996:89.
2. Ib. 1:20. 3. Ib. 1:18. 4. Ib. 1:33. 5. Ib. 1:79. 6. Ib. 1:37. 7. Ib.
1:38. 8. Ib. 1:21.
9. Denizart H. O prisioneiro da passagem (vídeo). Produção da
Colônia Juliano Moreira, Rio de Janeiro. Museu Arthur Bispo do
Rosario, 1982.
10. Ib. 1:183. 11. Ib. 1:23. 12. Ib. 1:25. 13. Ib. 1:66. 14. Ib. 1:100.
15. Ib. 1:26. 16. Ib. 1:57. 17. Ib. 1:64. 18. Ib. 1:54. 19. Ib. 1:59.
20. Ib. 1:68. 21. Ib. 1:53. 22. Ib. 1:62. 23. Ib. 1:74. 24. Ib. 1:75.
25. Ib. 1:80. 26. Ib. 1:94. 27. Ib. 1:97. 28. Ib. 1:55. 29. Ib. 1:71.
30. Ib. 1:92.
31. Rocha H, Przewodowski M. O Bispo do Rosario (vídeo).
Memória da Loucura. Rio de Janeiro. Museu Arthur Bispo do
Rosario, sem data.

http://www.abpbrasil.org.br/medicos/publicacoes/revista/arquivos/03Artigo%20Original%20-%203%20Bispo.pdf
















http://www.youtube.com/watch?v=x9wc-_XoCcw
Documentário em torno de Artur Bispo do Rosário, artista plástico, interno na Colônia Juliano Moreira. O vídeo registra a visão de mundo de Bispo e os seu trabalho - tapeçarias, bordados, colagens, instalações e pinturas - realizado ao longo de 7 anos, período em que se manteve recluso em seu quarto na Colônia. Parte da série "video-cartas", realizadas por Fernando Gabeira na década de 1980.














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